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quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Toda a Terra

 Depois da pangeia, a vontade do vento.
O caminho pro norte, a estrada pro sul
agora possuem imensos lestes e oestes.
Depois da pangeia, o plural,
os pronomes, os renomes, os informes;
depois da pangeia, o enorme!
Depois da pangeia, agora somos,
grandes braços, grandes passos,
grandes pássaros.
Somos asas, somos sonhos.
Temos sonhos de asas não temos?




Toda Terra.
Matheus R. Prudenciatto

Contemporaneidade...

o título deste post é dedicado ao meu amigo Marcelo Alves.
o poema em si é mais uma construção dos tempos da graduação,
um barato as aulas de Ética e Cidadania.

O reino do eu,
o reino perverso do eu.
O gozo fora-da-lei,
o oco sábio-rei.

O eu que é verdade
não tem que ser verdade,
o eu é a lei do hoje,
a oca sábia-lei.

O eu que tem espaço
num reino sem espaço.
O eu quer ter espaço,
a lei-espaço. Oca.


Contemporâneo.
Matheus R. Prudenciatto

terça-feira, 15 de novembro de 2011

pesquisando possiblidades...

Estava fuçando em uns textos lidos na graduação, e encontrei esta interessante entrevista.
Posto ela na íntegra, e logo a seguir minhas impressões sobre o que penso a respeito. (em itálico o texto literal)

Entrevista com o filósofo italiano Franco Berardi, feita por Verónica Gago, do jornal argentino Página 12, em 12 de novembro de 2007. 
 "A felicidade é subversiva"
Diz-se que a deserotização da vida diária é o pior desastre que a humanidade pode conhecer. É que se perde a empatia, a compreensão erótica do outro. Franco Berardi, antigo militante rebelde na Itália, analisa aqui como em todo seu trabalho, a relação complexa entre os processos sociais e as mudanças tecnológicas em curso.

Verónica: Você caracteriza o momento atual com "semiocapitalismo". Por que?
Berardi: "Semiocapitalismo" é o modo de produção no qual o acúmulo de capital é feito essencialmente por meio de uma produção e uma acumulação de sinais: bens imateriais que atuam sobre a mente coletiva, sobre a atenção, a imaginação e a psiquê social (psiquismo social). Graças à tecnologia eletrônica, a produção se torna elaboração e circulação de sinais (símbolos). Isso traz duas consequências importantes: que as leis da economia acabam influenciando o equilíbrio afetivo e psíquico da sociedade e, por outro lado que o equilíbrio psíquico e afetivo que se difunde na sociedade acaba agindo sobre a economia.

Verónica: Você fala da economia atual com "uma fábrica de infelicidade". Poderia explicar esta ideia?
Berardi: Os efeitos da competição (concorrência), da aceleração contínua dos ritmos produtivos, repercutem na mente coletiva causando uma excitação patológica que se manifesta como pânico ou causando depressão. As psicopatologias estão se tornando uma verdadeira epidemia nas sociedades desenvolvidas, e além disso, o culto à competição produz um sentimento generalizado de agressividade que se manifesta principalmente nas novas gerações. Recentemente, a Durex, maior produtor mundial de preservativos, encomendou uma pesquisa ao Instituto Harris Interactive. Vinte e seis países de culturas diversas foram escolhidos. E em cada país foram entrevistadas milhares de pessoas sobre um questão simples: que satisfações eles experimentavam com o sexo. Só 44 por cento dos entrevistados responderam que experimentavam prazer pela sexualidade. Isto significa que nós não somos mais capazes de prestar atenção em nós mesmos. Mas também não temos tempo suficiente para prestar atenção àqueles que vivem ao nosso redor. Prisioneiros da mola (espiral) e da competição (competitividade) já não somos capazes de entender nada do outro.

Verónica: É o que  você denuncia como "deserotização" da vida diária...
Berardi: A deserotização é o pior desastre que a humanidade pode conhecer, porque o fundamento da ética não está nas normas universais da razão prática, mas na percepção do corpo do outro como continuação sensível do meu corpo. Aquilo que os budistas chamam de grande compaixão, isto é, a consciência do fato de que seu prazer é meu prazer e que seu sofrimento é meu sofrimento. A empatia. Se nós perdermos esta percepção, a humanidade está acabada; a guerra e a violência entram em cada espaço de nossa existência e a piedade desaparece. Isto é exatamente o que nós limos diariamente nos jornais: a piedade está morta porque nós não somos capazes de ter empatia, ou seja, de uma compreensão erótica do outro.

Verónica: Qual é a conexão entre estes fenômenos com a dinâmica atual do capital?
Berardi: Eu acredito que nós temos que levar em consideração a relação entre "ciberespaço" - em amplificação constante e em aceleração constante - e o "cibertempo", ou seja, o tempo de nossa mente quanto aos aspectos racional e afetivo. O capitalismo impulsiona a atividade humana à uma aceleração contínua: aumentar a produtividade para aumentar os benefícios. Mas a atividade é hoje, principalmente, atividade da mente. Quem não consegue seguir o ritmo é deixado de lado, enquanto aqueles que procuram correr o mais rapidamente possível para pagar sua dívida com a sociedade competitiva, tem sua dívida aumentada continuamente. O colapso é inevitável e de fato um número cada vez maior de pessoas entra em depressão, ou sofre de ataques de pânico (síndrome do pânico), ou decide lançar-se debaixo do trem, ou assassinar seu companheiro de poltrona.
Na Inglaterra, a violência homicida está se difundindo nas escolas onde nos últimos meses houve uma verdadeira catástrofe (carnificina): dúzias se suicidaram com tiros de revólver. A guerra em todos os lugares: este é o espírito do nosso tempo. Mas esta guerra nasce da aceleração assassina que o capitalismo injetou em nossa mente.

Verónica: Frente a esse "diagnóstico", você encontra uma relação entre políticas e ação terapêutica?
Berardi: Eu acredito que as políticas não existem mais, pelo menos na Europa e nos EUA. O discurso é talvez diferente para os países da América Latina  onde se observa o retorno da política, que é muito interessante, mas é uma tendência contrária em relação ao resto do mundo. Nós vemos muito bem isto na Itália onde há um governo de centro-esquerda que faz exatamente a mesma política que a direita. Por que isto acontece? por que os partidos que se proclamam socialistas ou comunistas estão constrangidos em aceitar um política econômica hiper-liberal? Porque a democracia representativa já não conta mais e as opções fundamentais são impostas desde os grandes grupos financeiros, econômicos e militares. O vazio da política só pode ser preenchido por uma prática terapêutica, ou seja, por uma ação de relaxamento do organismo consciente coletivo. Deve-se comunicar às pessoas que não há nenhuma necessidade de respeitar a lei, que não há nenhuma necessidade de ser produtivo, que se pode viver com menos dinheiro e com mais amizade. É necessária uma ação de relaxamento generalizado da sociedade. E é necessária um ação psicoterapêutica que permita às pessoas  sentirem um completo estranhamento em relação à sociedade capitalista, que lhes permita sentir que a crise econômica pode ser o princípio de uma liberação, e que a riqueza econômica não é definitivamente, uma vida rica. Na verdade, a vida rica (riqueza) consiste no oposto: abandonar a necessidade de ter, de acumular, de controlar. A felicidade está em reduzir a necessidade.

Verónica: O que significa a questão da felicidade com desafio político?
Berardi: A questão da felicidade não é só uma questão individual, mas sim, uma questão mais coletiva, social. Criar ilhas de prazer, de relaxamento, de amizade, lugares nos quais esteja em vigor a lei da acumulação e da mudança. Esta é a premissa para uma nova política. A felicidade é subversiva quando sucede um processo coletivo.

Verónica: Agora, em que consistem os movimentos de resistência hoje? Qual é o papel do que você chama "medioactivismo" (ativismo midiático)?
Berardi: O "medioactivismo" é a ação autônoma dos produtores semióticos liberados das cadeias da submissão ao trabalho. A nova geração adquiriu competências de produção semiótica, técnica, informática, comunicativa, criativa, que o capital quer submeter a seu domínio. Mas os produtores semióticos podem organizar suas competências no lado de fora do circuito da produção capitalista e eles podem criar espaços de autonomia da produção e também da circulação cultural. Os centros sociais, as rádios livres (comunitárias), os blogs alternativos, a televisão de rua (TV comunitária) são espaços de auto-organização do trabalho semiótico.

Verónica: Você declarou que os movimentos como esses de Seattle* que eram feitos "pelos outros" estavam fadados ao fracasso. Qual é a crítica a esse modo de ação?
Berardi: o movimento antiglobalização foi muito importante, mas não conseguiu transformar a vida diária, não conseguiu criar autonomia nas relações entre trabalho e capital. Em um sábado a tarde, éramos nós milhares de pessoas em uma praça e na segunda-feira seguinte nós voltávamos a trabalhar na fábrica ou no escritório e a nos submeter ao comando do capital. Os movimentos conseguem produzir efeitos de verdadeira transformação social quando sua energia se torna autonomia em relação à exploração, quando a energia que se acumula no sábado a tarde na manifestação, se transfere à segunda-feira de manhã em organização autônoma no posto de trabalho.
* em 1999, manifestantes aderiram as ruas da cidade posicionando contra a reunião da Organização Mundial do Comercio. o posicionamento contra a política neoliberal motivou milhares de manifestantes a protestar contra os supostos donos do poder, presentes naquele espaço naquele momento.

Verónica: Que diferença há entre os novos espaços autônomos e os espaços criados na década de 70? Trata-se de diferentes conceitos de autonomia?
Berardi: Autonomia significa a capacidade da sociedade para criar formas de vida independentes do domínio do capital. Neste ponto há uma continuidade na história dos movimentos. Os movimentos são efetivos quando eles não se limitam a protestar, a opor-se, e conseguem construir espaços livres e, principalmente, quando conseguem fazer circular formas de pensamento e de ação que subtraiam a vida diária do modo de ganho capitalista. Neste sentido eu não vejo diferença entre aquilo que a autonomia significou nos anos 70 e o que significa hoje. O problema é que hoje é muito mais difícil criar uma autonomia de trabalho porque a precariedade força os trabalhadores a depender do despotismo (tirania) do capital para poder sobreviver.
Neste ponto é necessário refinar nossos argumentos organizacionais, para criar formas de vida e de ação que permitam à continuidade obter uma renda sem ter de pagar o preço do trabalho precário.

Verónica: Ao mesmo tempo, você diz que não faz sentido opor-se ao processo de flexibilização do trabalho. Por que?
Berardi: A flexibilidade está implícita na nova organização tecnológica do trabalho. A rede cria as condições para uma fragmentação do trabalho, para uma separação do trabalho em relação ao trabalhador. O capitalista já não tem necessidade do trabalho de uma pessoa, mas precisa dos fragmentos transitórios que a rede pode recombinar. Como os capitalistas podem ser impedidos de buscar o trabalho nas áreas pobres do mundo, onde os salários são mais baixos? Não há nenhuma possibilidade de controlar legislativamente esta precariedade do trabalho. Só há um modo de opor-se aos efeitos da precariedade, para libertar-se do medo e da submissão: criar espaços  de autonomia do trabalho e criar formas de vida, nas quais a propriedade seja administrada coletivamente. Os trabalhadores precários precisam de espaços coletivos e precisam ser capazes de se apropriar das coisas indispensáveis à vida. O capitalismo nos obriga a aceitar trabalhos de acordo com suas exigências de flexibilidade, mas nós podemos nos subtrair  a seu domínio  se pudermos criar espaços autônomos que unam os trabalhadores e que permitam aos trabalhadores pobres (precários) terem aquilo que necessitam. Os capitalistas não respeitam o direito das pessoas a ter uma renda (ganho)? Nós devemos aprender a não respeitar a propriedade dos capitalistas. Os trabalhadores precários (pobres) têm o direito de apropriar-se daquilo que é necessário para sua sobrevivência. Se nós não temos salário devemos buscar (lutar por) aquilo que nos faz falta onde isto esteja.

Verónica: Você acredita que é possível uma ação política a partir do discurso da precariedade?
Berardi: A ação política da organização dos trabalhadores precários é nossa tarefa principal. A derrota social que há trinta anos coloca os trabalhadores na defensiva e permite ao capital chantagear a esses trabalhadores depende propriamente do fato de que o trabalho precário parece, até este momento, inorganizável. Mas verdadeiramente aqui está o ponto:  como é possível organizar o trabalho precário apesar da falta de pontos de ligação estáveis? Como é possível conquistar autonomia apesar da dependência que a precariedade provoca no comportamento dos trabalhadores?      Até que nós consigamos responder a esta pergunta, até que nós não encontremos a via da organização autônoma dos trabalhadores precários, o absolutismo do capital devastará a sociedade, o ambiente, a vida diária.

Verónica: Você considera que as novas são "pós-alfabéticas", ou seja, que já não têm afinidade com a cultura crítica escrita. Então, a politização teria que valer-se de outros meios?
Berardi: Marshall Mcluhan, em um livro de 1964, Understandig media (Comprender los medios de comunicácion, Paidós, Barcelona, 1996)*, já tinha notado que a difusão das tecnologias eletrônicas iria causar uma verdadeira mutação. A passagem da tecnologia alfabética ( a imprensa, a palavra escrita) para as tecnologias de comunicação eletrônica teriam causado uma passagem das formas sequenciais às instantâneas e um transição de um universo crítico pra um universo neomítico. Hoje tudo isso é visto no comportamento comunicativo e psíquico da nova geração que pode ser definida como pós-alfabética porque passou da dimensão sequencial da comunicação escrita à dimensão configuracional da comunicação vídeo-eletrônica e da dimensão conectiva da rede.
*publicado também em português: "Compreender os Meios de Comunicação Extensões do Homem", pela Editora Relógio d´Água, 2008. 

Verónica: Mas, antes da "disneyficação do imaginário coletivo" que o senhor assinala, que tipo de imaginários acredita que são mobilizadores hoje em um sentido emancipatório?
Berardi: Eu não acredito que existam imaginários bons e imaginários maus. O imaginário é um magma no qual nossa mente se orienta a seletores de tipo simbólico A pergunta deveria ser então reformulada neste sentido: Que formas simbólicas têm hoje a capacidade de orientar em sentido emancipatório o imaginário social? A atenção se volta assim em direção à produção artística, literária, cinematográfica. Não tenho a intenção, certamente, de propor a ideia que sustenta que a arte é julgada na base de critérios políticos. Eu só tento dizer que a arte, às vezes tem a capacidade de funcionar como fator de redefinição do campo imaginário. Na produção contemporânea existem autores que têm essa capacidade, eu penso em escritores como Jonathan Franzen ou como Amos Oz, eu penso em cineastas com Kim Ki duk ou como Ken Loach de "It´s a free world" (Este mundo é livre). mas a relação entre fatores de orientação simbólica no imaginário coletivo é uma relação assimétrica, impredizível, irredutível a qualquer simplificaçao ou qualquer moralismo.


Gosto muito desta entrevista. Desperta talvez pra possibilidades. 
Pautado nela, e com mais algumas (muitas!) outras inquietações que repousam sobre esta minha cabeça, fiz um pequeno texto. Pois vamos a ele então:

A sociedade contemporânea, embasada pelo capitalismo, se constrói sob alicerces nefastos. Sob estes alicerces, tem se assistido a um grande teatro onde os atores, ansiosos por representar, têm colaborado para este grandioso roteiro carnificista, onde seus próprios papéis é que estão em jogo, e sob a hora da morte.                                                            
Pretensioso?  Incoerente? Difícil? As afirmações acima podem sim despertar estes questionamentos. Ou, simplesmente, não trazer à tona nada do qual elas se propõem. Por que não?                                                                                    
Porque a construção desta resposta, ou a afirmação (negação?) dela, paira sobre o imenso desinteresse que o modo capitalista de viver proporciona à contemporaneidade. Não há, neste momento da história, vontade alguma de mudar o roteiro desta peça. Pior, não há paixão alguma em encenar esta peça!                       
A não-paixão dos atores em seus papeis acaba por transformar este teatro numa imensa novela, com capítulos repetidamente feitos para um único propósito, a consagração do diretor da mesma. Esse diretor, invisível, porém concreto, positivo, nefasto. É ele mesmo, o capital, condutor da mente humana a um não-pensar, a um não-simbolizar a existência. Terrivelmente ocos de paixão, de sentimento, de existência a sociedade caminha, sem lugar algum a alcançar, sem tempo algum a conquistar. O capital, o diretor, é e transforma a todos em seres anacrônicos.                                                                                     
É importante a sociedade pensar em encerrar logo este roteiro, pois a platéia, também desprovida de paixão, não aplaudirá ato algum, nem tampouco se resignará sobre. A platéia talvez vire as costas para o palco. Quem sabe não há mais história ali, na saída deste teatro? Vale sim, espiar! Talvez seja ali que a multidão se protagonize. Talvez ali a multidão se ame, talvez ali a multidão crie sua felicidade. Deste lado do teatro, a subversão e a tirania não encenam. Será que aplaudem?


Matheus R. Prudenciatto

sábado, 12 de novembro de 2011

pra início de conversa...

acho que nossa instância primeira é a existência.
sem existir, não há liberdade,
existindo, há possibilidades,
e definitivamente, somos seres afinal.
o poema a seguir é uma possibilidade de imaginar isto...

Eu existo,
Tu existes, ele existe.
Nós existimos,
Vós existis,
Eles, e elas existem.
A vida é presente, cada um de nós é o seu indicativo.
A vida se fez presente na perfeição imperfeita do nosso passado
e segue à existir num futuro,
sob a mercê perversa de um imperativo.
Este, letal, lança seu olhar sobre o que há.
É o fim?
Não, para existirmos,
Exista eu,
Existe tu,
Exista ele,
Exista ela,
Existamos nós.


Verbo existência.
Matheus R. Prudenciatto